terça-feira, 25 de março de 2014

Conteúdo da prova de Filosofia 1 ano do Ensino Médio

O que é a filosofia?

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Olhos sempre despertos, a coruja é o símbolo da filosofia
A filosofia surge na Grécia Antiga como uma atividade especial do homem sábio, o amigo do saber (filo + sophia = amor à sabedoria). Desde então inúmeras foram as tentativas de definir exatamente o que procura e o que faz um filósofo. Todos reconhecem a sua importância e a imensa utilidade, são porém imprecisos e divergem em relação a determinar qual a sua verdadeira ciência. Aristóteles, discípulo de Platão e fundador do Liceu, uma escola voltada para o saber e a ciência que ele instalou em Atenas no século IV a.C., fez uma das mais claras exposições sobre as qualidades da filosofia.

tela de Rembrandt
Aristóteles contemplando o busto de Homero
A principal característica que Aristóteles vê num filósofo é que ele não é um especialista. O sophós, o sábio, é um conhecedor de todas as coisas sem possuir uma ciência específica. O seu olhar derrama-se pelo mundo, sua curiosidade insaciável o faz investigar tanto os mistérios do cosmo e da physis, a natureza, como as que dizem respeito ao homem e à sociedade. No fundo, o filósofo é um desvelador, alguém que afasta o véu daquilo que está a encobrir os nossos olhos e procura mostrar os objetos na sua forma e posição original, agindo como alguém que encontra uma estátua jogada no fundo do mar coberta de musgo e algas, e gradativamente, afastando-as uma a uma, vem a revelar-nos a sua bela forma e esplendor (a verdade entre os gregos está associada ao belo).
O que vem a ser um sábio?

pintura de Rafael
Heráclito, dito o obscuro
O que distingue o sábio é que ele tem o conhecimento das coisas mais difíceis. Entender que o fogo queima ou que a chuva molha é algo comum a qualquer um pois sentir, ter sensações, é algo universal entre os homens, mas possuir as noções mais exatas das causas últimas e ser capaz de dar conta delas, transmitindo-as pelo ensino, esse sim é um apanágio, uma virtude do homem sábio. Ele também se distingue do teólogo na medida em que o seu objetivo e atingir a verdade e não forjar um dogma (algo que não se pode discutir ou questionar).
A Ciência Mais Importante
Em seguida, em decorrência lógica do que foi dito, a filosofia para Aristóteles é, por assim dizer, a mãe de todas as ciências, porque ninguém impõe critérios a ela. Ao contrário, se existem regras, se existem parâmetros para chegar a algo específico, é a filosofia quem os estabelece, pois é do dedutivo, do geral, que partem as linhas orientadoras que guiam a mente do homem em direção a um determinado conhecimento.

As coisas mais difíceis de se saber
Afinal quais são essas coisas mais difíceis de se conhecer? São as que têm valor universal, as que estão mais afastadas dos sentidos e que dependem mais da mente e não das sensações: são as ciências dos princípios. Estas, por sua vez, são mais exatas quanto menores forem os princípios em que se apoiam, e, ao contrário, são menos exatas se resultam de múltiplos princípios. Por isso a aritmética é mais rigorosa do que a geometria.
Ensino e Conhecimento
A ciência que estuda as causas dos fatos particulares é a mais apta ao ensino. Exatamente por isso, por dominar os princípios e as causas de todas as coisas possíveis de serem entendidas, é que a filosofia é uma ciência especulativa, que trabalha com categorias abstratas, mas que obedecem a um lógica extremamente rigorosa a qual somente o homem sábio domina.
Admiração e Mitos

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É a admiração pelo cosmo que faz o filósofo
O que leva afinal um homem à filosofia? Para Aristóteles é a admiração. Desde que dotado para tanto, o homem impressionado pelo mundo que o circunda, pela variedade e diversidade das coisas que lhe são próximas, e mesmo as que se encontram bem distantes, tenta explicá-las com o recurso da razão. É esta inclinação dele para o maravilhoso que explica o fascínio que os mitos exercem sobre ele, porque nada existe de mais fantástico. Neste seu afã ele não busca nenhuma utilidade, a filosofia é uma arte desinteressada. Ao contrário da geometria (medir a terra), ela não se move por nenhuma utilidade, porque a filosofia é um fim em si mesmo, é a busca de uma auto-satisfação que apenas diz respeito ao sábio, que acima de tudo é um desinteressado das coisas práticas, dos dinheiros e dos confortos.
Os Atributos do Sábio

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O Mar Egeu e suas margens, berço da filosofia
Para alcançar-se a ser um sábio, evidentemente que não basta ter apenas vontade de sê-lo. Aristóteles na Ética a Nicômaco estabeleceu um conjunto de pré-condições, ou de disposições naturais para assim chegar-se à filosofia, as virtudes dianoéticas, próprias da parte intelectual da alma, que são distintas da ética e da moral, compostas pela:
1 - episteme (ciência), ser dotado para o conhecimento; 2 - praxis téchne, (uma habilidade, uma arte qualquer), uma disposição produtiva;
3 - frónesis, (a prudência, a sapiência), uma disposição verdadeira para o que é bom e o que é mau;
4 - noûs (inteligência) uma capacidade para a reflexão dialética expontânea, e por último;
5 - a sophia (a sabedoria) uma vocação para as coisas teóricas.


O Filósofo Ideal


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O sábio introspectivo
Interessa entender a diferença que separa Aristóteles de Platão em relação a quem representaria melhor o tipo de filósofo ideal. A partir da larga convivência que teve com Sócrates, Platão imaginou-o um ser político, alguém permanentemente envolvido nos assuntos e nos dilemas da comunidade. Um filósofo cidadão, voltado para o aperfeiçoamento das instituições e interessado em ajudar a esculpir o ativista político superior, quando não ele mesmo envolvido, voltado para o bem comum. Alguém a quem Jean-Paul Sartre, o pensador do nosso século, chamou de engajado. Tão grande foi essa simbiose do filósofo com a política que Platão projetou-o (A República) como um arconte, o governante supremo do Estado Ideal, um philo-basileus (o rei-filósofo) . Aristóteles, bem ao contrário, tinha em Tales e Anaximandro, pensadores da escola jônica, tipos eminentemente especulativos, como os mais assemelhados ao ideal que pretendia, mais próximos ao acadêmico universitário dos dias de hoje, obcecado apenas por suas abstrações, voltados para o que H-I Marrou chamou de " busca do seu ideal de perfeição interior, ilhando-se assim numa heróica solidão" .
O FILÓSOFO IDEAL
Para Platão
(428-348 a.C.)
Para Aristóteles
(384-322 a.C.)
O tipo idealSócratesTales, Anaximandro
Voltado paraa política, para a comunidadea introspeção, para si mesmo
Local apropriadoAcademia platônicaLiceu peripatético
Fim últimoa administração, a açãoa contemplação, a admiração
A filosofia é divina

pintura de Rafael
Platão e Aristóteles
Para Aristóteles a filosofia é uma atividade divina. De certa forma entende-se isso em razão do filosofo partilhar de certos segredos e determinados conhecimentos que muitos acreditam serem exclusivos dos deuses. Como Deus é a causa primeira de tudo e a filosofia é a causa primeira do conhecimento superior, ela é inegavelmente a mais divina das ciências. Da mesma forma que Deus vive apartado dos homens e do próprio mundo que ele criou, o filósofo tem a mesma atitude, afastando-se dos mortais, vivendo num lugar especial. No caso de Aristóteles, este Olimpo humano era o Liceu, a escola de sabedoria, um reduto de sábios e iniciados que ele fundara em Atenas (provavelmente no ano 335 a.C.), para contrapor-se à Academia de Platão.
Os Tipos de Vida

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Protágoras, o mestre dos mestres
No procedimento de endeusamento da atividade filosófica, Aristóteles aponta a existência de três tipos de vida mais ou menos dignas de serem levadas. Separando o universo das atividade humanos em dois grandes grupos, o do negócio e o do ócio, Aristóteles desprezou inteiramente o primeiro. Quem entrega-se ao negócio, ao trabalho ou ao comércio, a principio está descartado. Por conseguinte só merecem atenção e relevância os que dedicam-se ao ócio ( não entendido como preguiça, mas como uma atitude de disponibilidade para o seu aperfeiçoamento). Socialmente isso significa considerar apenas a gente da nobreza, os que podiam dar-se ao luxo de não ter que ganhar o pão de cada dia com o suor do rosto. No seu " Ética Eudemiana" ele expõe quais eram esse três tipo de vida:
  • o que se conduzem voltados para o prazer e para o gozo, deixando-se dominar pela multiplicidade das sensações, empolgando-se pelas experiência carnais, sensoriais.
  • a dos homens de ação, atraídos pela coisas do mundo político, para as grandes celeumas e participações coletivas, comuns à vida dos estadistas e dos políticos
  • a dos que se entregam à contemplação, à vida filosófica, liberta dos apelos carnais e longe das inconstâncias do mundo passional, voltado para o saber e para o constante aperfeiçoamento. 
  • A Excelência do Homem Sábio
    A postura de Aristóteles em privilegiar a vida ensimesmada do homem sábio, opunha-se a dos sofistas que circulavam em meio aos lugares públicos como também àquela que Sócrates levou, mas que depois tornou-se comum entre os estóicos e os epicuristas do período helenístico. Essa apologia ao pensador, oposta ao do homem de ação, ao político, deve-se igualmente à motivos históricos bem concretos. Na época de Aristóteles, que viveu por inteiro no século IV a.C., deu-se o declínio definitivo da polis. A independência das cidades-estados gregas deixara de existir, independência que o grande orador ateniense Demóstenes tentou de todos os modos inutilmente defender. No seu lugar ergueu-se o poder dos reis macedônicos, de Felipe II e do seu filho Alexandre, o grande, educado por Aristóteles. A nova autoridade suprimiu com a autonomia delas, ocupando-as com guarnições de soldados reduzindo-as a pequenos átomos do grande império helenístico que eles construíram e com o regime dos diádocos que sucedeu a Alexandre após a morte precoce dele em 323 a.C.. Com o fim da vida política local não tinha realmente nenhum sentido preparar-se para as injunções da política ou para as questões públicas em geral.

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    Um viés de um templo
    O Herói e o Sábio

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    Uma vida dedicada a buscar a verdade
    Aristóteles também criou um mito que, muito mais tarde, na época do cristianismo, consagrou-se com o surgimento do monge, um devoto da nova fé que retirava-se do mundo profano para consagrar-se inteiramente à purificação da sua alma. Era a versão cristã do sábio pagão. Porém na época em que ele defendeu a vida do filósofo como a preferida de ser vivida pelo homem livre superior, Aristóteles estabeleceu uma alternativa à celebração do heróico guerreiro, tão comum naqueles tempos, fazendo com a existência de um homem entregue ao pensamento fosse o mais alto grau a que um ser humano poderia ambicionar atingir, e não a de um valentão armado com espada e escudo.

     

  • Mitologia Grega
    Características da Mitologia Grega, principais mitos e lendas, deuses gregos, Minotauro, Medusa, Hércules, a influência da religião na vida política, econômica e social dos gregos
    minotauro - história e mitologia grega
    Minotauro: figura da mitologia grega 
       
    Introdução
    Os gregos criaram vários mitos para poder passar mensagens para as pessoas e também com o objetivo de preservar a memória histórica de seu povo. Há três mil anos, não havia explicações científicas para grande parte dos fenômenos da natureza ou para os acontecimentos históricos.
    Portanto, para buscar um significado para os fatos políticos, econômicos e sociais, os gregos criaram uma série de histórias, de origem imaginativa, que eram transmitidas, principalmente, através da literatura oral.
     Grande parte destas lendas e mitos chegou até os dias de hoje e são importantes fontes de informações para entendermos a história da civilização da Grécia Antiga. São histórias riquíssimas em dados psicológicos, econômicos, materiais, artísticos,  políticos e culturais.

    Entendendo a Mitologia Grega. 
    Os gregos antigos enxergavam vida em quase tudo que os cercavam, e buscavam explicações para tudo. A imaginação fértil deste povo criou personagens e figuras mitológicas das mais diversas. Heróis, deuses, ninfas, titãs e centauros habitavam o mundo material, influenciando em suas vidas. Bastava ler os sinais da natureza, para conseguir atingir seus objetivos. A pitonisa, espécie de sacerdotisa, era uma importante personagem neste contexto. Os gregos a consultavam em seus oráculos para saber sobre as coisas que estavam acontecendo e também sobre o futuro. Quase sempre, a pitonisa buscava explicações mitológicas para tais acontecimentos. Agradar uma divindade era condição fundamental para atingir bons resultados na vida material. Um trabalhador do comércio, por exemplo, deveria deixar o deus Hermes sempre satisfeito, para conseguir bons resultados em seu trabalho.

    Os principais seres mitológicos da Grécia Antiga eram :

    - Heróis : seres mortais, filhos de deuses com seres humanos. Exemplos: Herácles ou Hércules e Aquiles.
    - Ninfas : seres femininos que habitavam os campos e bosques, levando alegria e felicidade.
    - Sátiros : figura com corpo de homem, chifres e patas de bode.
    - Centauros : corpo formado por uma metade de homem e outra de cavalo.
    - Sereias : mulheres com metade do corpo de peixe, atraíam os marinheiros com seus cantos atraentes.
    - Górgonas : mulheres, espécies de monstros, com cabelos de serpentes. Exemplo: Medusa
    - Quimera : mistura de leão e cabra que soltava fogo pelas ventas.
    Medusa Medusa: mulher com serpentes na cabeça
    O Minotauro 
    É um dos mitos mais conhecidos e já foi tema de filmes, desenhos animados, peças de teatro, jogos etc. Esse monstro tinha corpo de homem e cabeça de touro. Forte e feroz, habitava um labirinto na ilha de Creta. Alimentava-se de sete rapazes e sete moças gregas, que deveriam ser enviadas pelo rei Egeu ao Rei Minos, que os enviavam ao labirinto. Muitos gregos tentaram matar o minotauro, porém acabavam se perdendo no labirinto ou mortos pelo monstro.
    Certo dia, o rei Egeu resolveu enviar para a ilha de Creta seu filho, Teseu, que deveria matar o minotauro. Teseu recebeu da filha do rei de Creta, Ariadne, um novelo de lã e uma espada. O herói entrou no labirinto, matou o Minotauro com um golpe de espada e saiu usando o fio de lã que havia marcado todo o caminho percorrido.
    Deuses gregos
    De acordo com o gregos, os deuses habitavam o topo do Monte Olimpo, principal montanha da Grécia Antiga. Deste local, comandavam o trabalho e as relações sociais e políticas dos seres humanos. Os deuses gregos eram imortais, porém possuíam características de seres humanos.
    Ciúmes, inveja, traição e violência também eram características encontradas no Olimpo. Muitas vezes, apaixonavam-se por mortais e acabavam tendo filhos com estes. Desta união entre deuses e mortais surgiam os heróis.
    Conheça os principais deuses gregos :
    Zeus - deus de todos os deuses, senhor do Céu.
    Afrodite
    - deusa do amor, sexo e beleza.
    Poseidon
    - deus dos mares
    Hades - deus das almas dos mortos, dos cemitérios e do subterrâneo.
    Hera - deusa dos casamentos e da maternidade.
    Apolo - deus da luz e das obras de artes.
    Ártemis - deusa da caça e da vida selvagem.
    Ares - divindade da guerra.
    Atena - deusa da sabedoria e da serenidade. Protetora da cidade de Atenas.Cronos - deus da agricultura que também simbolizava o tempo.
    Hermes - mensageiro dos deuses, representava o comércio e as comunicações.
    Hefesto - divindade do fogo e do trabalho. 


    Mito de Édipo

    Laio, Rei de Tebas e marido de Jocasta, vivia amargurado por não ter filhos, pelo que, decidiu consultar o Oráculo, tendo-lhe, este, advertido que filho que gerasse havia de o assassinar. Apesar das advertências, Jocasta engravida e Laio, quando o bebé nasceu, ordenou a um servo que o pendurasse pelos pés numa árvore, para que este morresse. Daí o nome Édipo (que significa pés inchados).
    O servo de Laio, desrespeitando as ordens, acabou por colocar a criança num cesto e jogou-a ao rio, acabando este, por ser resgatado por um rei duma terra distante, que o elegeu como seu filho. Este, já homem, também consultou o Oráculo, o qual o aconselhou a evitar a sua pátria, pois iria ser o assassino de seu pai e marido de sua mãe. Desconhecendo as suas origens e pensando-se filho de Pôlibo e Mérope, reis de Corinto, Édipo decidiu partir rumo a Tebas. Durante o seu percurso, e no meio de uma encruzilhada, deparou-se com um velho com o qual manteve uma acérrima discussão acabando por matá-lo.
    Chegado a Tebas decifrou o enigma da Esfinge (monstro com cabeça de mulher e corpo de leão), que impossibilitava a entrada na cidade, e como nunca ninguém o havia decifrado, a Esfinge jogou-se ao mar, tendo Édipo libertado a cidade da sua maldição. Creonte, irmão de Jocasta, havia prometido a mão desta a quem libertasse a cidade da Esfinge, ganhando assim, Édipo, o direito a casar com Jocasta, agora viúva.
    Casaram, Édipo foi proclamado Rei e tiveram dois filhos e duas filhas, reinando sem grandes dificuldades, até ao dia em que se instala a peste na cidade e Édipo decide consultar o Oráculo, que lhe refere que a peste cessaria quando fosse expulso o assassino de Laio. Édipo dispôs-se a encontrá-lo, mas quando se apercebeu que ele próprio fora o assassino de Laio, seu pai, e o esposo de sua mãe, e vendo que apesar de fugir contra a profecia esta acabou por se realizar, arrancou os olhos e deixou a sua pátria.

    O mito da Caverna


    O Mito da Caverna ou Alegoria da Caverna escrito por Platão em sua obra A República (livroII) pode ser entendido como uma metáfora das condições humanas frente à ignorância que nos cerca e a dificuldade que temos de sair dessa condição de falta de conhecimento, dificuldade de nos depararmos com a verdade que existe por detrás das aparências das coisas. O mito salienta também a importância do conhecimento filosófico e a educação como meio de superação da ignorância,ou seja, da aparência enganosa que certos fatos podem ocasionar para o conhecimento mais puro e verdadeiro, mais próximo do que é real. O mito retrata a passagem gradativa do senso comum no que se refere à visão de mundo e explicação da realidade para o conhecimento filosófico, racional, o qual investiga as respostas criteriosamente.
    Platão procurava a essência das coisas para além do mundo sensível (material), para além das simples aparência que apresentavam tais coisas E acreditava que o homem que se liberta da caverna como Sócrates, estaria exposto ao risco de ser morto por expressar novos conhecimentos, pensamentos e almejar indicar um mundo totalmente diferente daquele que os demais moradores da caverna conheciam e tomavam como real e verdadeiro, embora fosse ilusório. Adaptando para a nossa realidade, é como se nós acreditássemos, desde o nascimento que o mundo é de determinada forma, e derrepente chegasse alguém e nos falasse que quase tudo aquilo era ilusório, enganoso e falso.
    Percebam que com esta alegoria, ou este mito, Platão nos convida a ponderar que, se as coisas se passassem, na existência humana, comparavelmente à circunstância da caverna; ilusoriamente, com os homens acorrentados a falsas crenças, preconceitos, ideias enganosas e, por tudo isso, seriam inertes em suas poucas possibilidades. Leia o Mito abaixo e raciocine a respeito.

    Vídeo O Mito da caverna

    video

     

    SÓCRATES – Figura-te agora o estado da natureza humana, em relação à ciência e à ignorância, sob a forma alegórica que passo a fazer. Imagina os homens encerrados em morada subterrânea e cavernosa que dá entrada livre à luz em toda extensão. Aí, desde a infância, têm os homens o pescoço e as pernas presos de modo que permanecem imóveis e só vêem os objetos que lhes estão diante. Presos pelas cadeias, não podem voltar o rosto. Atrás deles, a certa distância e altura, um fogo cuja luz os alumia; entre o fogo e os cativos imagina um caminho escarpado, ao longo do qual um pequeno muro parecido com os tabiques que os pelotiqueiros põem entre si e os espectadores para ocultar-lhes as molas dos bonecos maravilhosos que lhes exibem.

    GLAUCO - Imagino tudo isso.

    SÓCRATES - Supõe ainda homens que passam ao longo deste muro, com figuras e objetos, que se elevam acima dele, figuras de homens e animais de toda a espécie, talhados em pedra ou madeira. Entre os que carregam tais objetos, uns se entretêm em conversa, outros guardam em silêncio.

    GLAUCO - Similar quadro e não menos singulares cativos!

    SÓCRATES - Pois é nossa imagem perfeita. Mas, dize-me: assim colocados, poderão ver de si mesmos e de seus companheiros algo mais que as sombras projetadas, à claridade do fogo, na parede que lhes fica fronteira?

    GLAUCO - Não, uma vez que são forçados a ter imóveis a cabeça durante toda a vida.

    SÓCRATES - E dos objetos que lhes ficam por detrás, poderão ver outra coisa que não as sombras?

    GLAUCO - Não.

    SÓCRATES - Ora, supondo-se que pudessem conversar, não te parece que, ao falar das sombras que vêem, lhes dariam os nomes que elas representam?

    GLAUCO - Sem dúvida.

    SÓCRATES - E, se, no fundo da caverna, um eco lhes repetisse as palavras dos que passam, não julgariam certo que os sons fossem articulados pelas sombras dos objetos?

    GLAUCO - Claro que sim.

    SÓCRATES - Em suma, não creriam que houvesse nada de real e verdadeiro fora das figuras que desfilaram.

    GLAUCO - Necessariamente.

    SÓCRATES - Vejamos agora o que aconteceria, se se livrassem a um tempo das cadeias e do erro em que laboravam. Imaginemos um destes cativos desatado, obrigado a levantar-se de repente, a volver a cabeça, a andar, a olhar firmemente para a luz. Não poderia fazer tudo isso sem grande pena; a luz, sobre ser-lhe dolorosa, o deslumbraria, impedindo-lhe de discernir os objetos cuja sombra antes via.
    SÓCRATES - Que te parece agora que ele responderia a quem lhe dissesse que até então só havia visto fantasmas, porém que agora, mais perto da realidade e voltado para objetos mais reais, via com mais perfeição? Supõe agora que, apontando-lhe alguém as figuras que lhe desfilavam ante os olhos, o obrigassem a dizer o que eram. Não te parece que, na sua grande confusão, se persuadiria de que o que antes via era mais real e verdadeiro que os objetos ora contemplados?

    GLAUCO - Sem dúvida nenhuma.

    SÓCRATES - Obrigado a fitar o fogo, não desviaria os olhos doloridos para as sombras que poderia ver sem dor? Não as consideraria realmente mais visíveis que os objetos ora mostrados?

    GLAUCO - Certamente.

    SÓCRATES - Se o tirassem depois dali, fazendo-o subir pelo caminho áspero e escarpado, para só o liberar quando estivesse lá fora, à plena luz do sol, não é de crer que daria gritos lamentosos e brados de cólera? Chegando à luz do dia, olhos deslumbrados pelo esplendor ambiente, ser-lhe ia possível discernir os objetos que o comum dos homens tem por serem reais?

    GLAUCO - A princípio nada veria.

    SÓCRATES - Precisaria de algum tempo para se afazer à claridade da região superior.
    Primeiramente, só discerniria bem as sombras, depois, as imagens dos homens e outros seres refletidos nas águas; finalmente erguendo os olhos para a lua e as estrelas, contemplaria mais facilmente os astros da noite que o pleno resplendor do dia.

    GLAUCO - Não há dúvida.

    SÓCRATES - Mas, ao cabo de tudo, estaria, decerto, em estado de ver o próprio sol, primeiro refletido na água e nos outros objetos, depois visto em si mesmo e no seu próprio lugar, tal qual é.

    GLAUCO - Fora de dúvida.

    SÓCRATES - Refletindo depois sobre a natureza deste astro, compreenderia que é o que produz as estações e o ano, o que tudo governa no mundo visível e, de certo modo, a causa de tudo o que ele e seus companheiros viam na caverna.

    GLAUCO - É claro que gradualmente chegaria a todas essas conclusões.

    SÓCRATES - Recordando-se então de sua primeira morada, de seus companheiros de escravidão e da idéia que lá se tinha da sabedoria, não se daria os parabéns pela mudança sofrida, lamentando ao mesmo tempo a sorte dos que lá ficaram?

    GLAUCO - Evidentemente.

    SÓCRATES - Se na caverna houvesse elogios, honras e recompensas para quem melhor e mais prontamente distinguisse a sombra dos objetos, que se recordasse com mais precisão dos que precediam, seguiam ou marchavam juntos, sendo, por isso mesmo, o mais hábil em lhes predizer a aparição, cuidas que o homem de que falamos tivesse inveja dos que no cativeiro eram os mais poderosos e honrados? Não preferiria mil vezes, como o herói de Homero, levar a vida de um pobre lavrador e sofrer tudo no mundo a voltar às primeiras ilusões e viver a vida que antes vivia?

    GLAUCO - Não há dúvida de que suportaria toda a espécie de sofrimentos de preferência a viver da maneira antiga.

    SÓCRATES - Atenção ainda para este ponto. Supõe que nosso homem volte ainda para a caverna e vá assentar-se em seu primitivo lugar. Nesta passagem súbita da pura luz à obscuridade, não lhe ficariam os olhos como submersos em trevas?

    GLAUCO - Certamente.

    SÓCRATES - Se, enquanto tivesse a vista confusa -- porque bastante tempo se passaria antes que os olhos se afizessem de novo à obscuridade -- tivesse ele de dar opinião sobre as sombras e a este respeito entrasse em discussão com os companheiros ainda presos em cadeias, não é certo que os faria rir? Não lhe diriam que, por ter subido à região superior, cegara, que não valera a pena o esforço, e que assim, se alguém quisesse fazer com eles o mesmo e dar-lhes a liberdade, mereceria ser agarrado e morto?

    GLAUCO - Por certo que o fariam.

    SÓCRATES - Pois agora, meu caro GLAUCO, é só aplicar com toda a exatidão esta imagem da caverna a tudo o que antes havíamos dito. O antro subterrâneo é o mundo visível. O fogo que o ilumina é a luz do sol. O cativo que sobe à região superior e a contempla é a alma que se eleva ao mundo inteligível. Ou, antes, já que o queres saber, é este, pelo menos, o meu modo de pensar, que só Deus sabe se é verdadeiro. Quanto à mim, a coisa é como passo a dizer-te. Nos extremos limites do mundo inteligível está a idéia do bem, a qual só com muito esforço se pode conhecer, mas que, conhecida, se impõe à razão como causa universal de tudo o que é belo e bom, criadora da luz e do sol no mundo visível, autora da inteligência e da verdade no mundo invisível, e sobre a qual, por isso mesmo, cumpre ter os olhos fixos para agir com sabedoria nos negócios particulares e públicos. (Extraído de "A República" de Platão. 6° ed. Ed. Atena, 1956, p. 287-291).